MARÍTIMAS VOL 01: À DERIVA | conheça nossa primeira capa, editorial e link para leitura


capa de Lidiane Dutra

No começo, havia a etimologia. Palavras nascem de um pacto que as faz ser o que são. Se você chegou até aqui, provavelmente já acompanha nossas redes sociais e sabe da nossa tradicional definição da palavra “maré”. Repetimos, por acreditar na regularidade dos ritos:

Maré: substantivo feminino; movimento regular e periódico das águas do mar; estado de ânimo; disposição; conjuntura: circunstâncias que ocorrem num dado momento; multidão: uma maré humana invadiu a praia.

Ainda, a maré é comandada pela lua - símbolo feminino por excelência. (Não devemos entender, no entanto, o símbolo feminino como uma exclusividade de gênero feminino. Quem sabe, futuramente, a gente consiga ter um dedo de prosa sobre imaginário).

Banhamos os nossos corpos marcados pela experiência de ser mulher nas águas das nossas vivências em sociedade e nossa produção artística, que reflete o conjunto e o conjuro com outros corpos e subjetividades.

Primeiro, gostaríamos de contar a história do nascimento da capa dessa edição. Lidiane Dutra faz uma releitura da Vênus de Botticelli. Vênus de Lidy ganha cabelos azuis, mantendo seu olhar tão enigmático quanto o sorriso da paciente e sarcástica, Monalisa.

Vale mencionar o mito de Afrodite*, pois é importante pontuar que essa deusa (que veio a ser Vênus na mitologia romana) está associada à beleza e à sensualidade. Ela é deusa do amor, mas a questão de um corpo mais independente se sobrepõe a uma possível ideia de um amor mais dominante. Não lhe interessava a fertilidade ou o matrimônio, havia outras deusas para tais funções. Afrodite, nesse sentido, é uma demonstração da liberdade dos prazeres, pois não se obriga a uma instituição e entrega-se àquilo que lhe satisfaça melhor. Isso resumindo muito grossamente o mito, desculpa aí, gente.

Por que uma capa com uma figura tão ocidental, tão branca, tão representativa de um ideário masculino da Renascença? Se você reparar na obra de Botticelli, Vênus está de pé naquela concha, tapando “suas vergonhas” – exceto por um peitinho que sempre escapa, não? – e claramente sem paciência para posar para a pintura. Uma forte razão para sua existência nessa capa: ela é cria da espuma do mar (esse é o significado de Afrodite). Nada mais marítima.

Com o mar invadindo seus cabelos nessa nova roupagem, Vênus está pronta para partir, ficar à deriva, descansar na imensidão do oceano e ceder lugar a outras vivências, outras classes e raças, outras culturas e lutas das mulheres. Vamos apreciar outras formas de existência, de olhar, de ser mãe, de enfrentar o que a realidade nos impõe.

Essa é nossa edição À deriva. Vocês têm em mãos (na tela) uma revista com 24 autoras competentes e 35 trabalhos impecáveis. Confessamos, foi um perrengue selecionar as obras, pois recebemos 58 trabalhos e, a grande maioria, estava à altura da revista. No entanto, foi preciso alinhavar o tema, os textos entre si, além das imagens, e isso serviu de norte para a árdua tarefa de curadoras desses trabalhos. (temos um post falando sobre esse processo >>> aqui)

Espero que essa edição seja recebida com muito carinho, ela é fruto de um trabalho bastante intenso – por parte das artistas e das editoras.

Entra no barquinho, pega uns bons drinks e boa leitura!


Por Suellen Rubira, editora



*ERRATA: No texto que saiu no editorial da zine, o nome da Deusa Afrodite está trocado em um dos parágrafos. Em seu lugar, saiu Atenas (um lapso irônico, uma vez que Atena é antagonista de Afrodite. Vai ver ela não quis ficar de fora, aproveitou uma piscada e se meteu na zine). De qualquer forma, pedimos desculpas. E agrademos às leituras atentas que perceberam o erro. 

Beijos das editoras.

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